sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Estréia: Ratatouille

É interessante notar como a Pixar Animation se supera a cada produção, apoiando-se basicamente em variações sobre o mesmo tema, ou seja, a vitória do talento individual sobre a mediocridade geral e coletiva. Em Toy Story, os brinquedos - que são extremamente inteligentes, criativos e independentes - abrem mão de seus próprios talentos para entrar no jogo limitado dos humanos. É particularmente emocionante a cena na qual Buzz Lightyear descobre que ele não é, de fato, um astronauta, mas apenas o instrumento de brincadeiras de uma criança.

Em Vida de Inseto, a formiga Flick é hostilizada pelo formigueiro (nada mais coletivo) por que ninguém entende ou aceita o seu incrível talento individual de inventora. O peixinho portador de uma pequena deficiência física em sua nadadeira é o mote propulsor de toda a aventura de Procurando Nemo por que se recusa a obedecer os limites impostos por seu assustado pai. Em Os Incríveis, toda uma horda de super-heróis dos mais talentosos é proibida de exercer seus poderes para satisfazer à mediocridade geral de uma sociedade desprovida de talentos especiais.

Os heróis da Pixar são estes indivíduos especiais e quase sempre solitários que ousam se erguer contra os padrões pré-estabelecidos impostos por uma coletividade ignorante. E agora, Remy, de Ratatouille, é um ratinho francês de extremo bom gosto que não se encaixa na comunidade "comedora de lixo" da qual faz parte. Dotado de olfato e paladar dos mais aguçados, ele é apaixonado por gastronomia e não consegue entender como sua família se conforma em se alimentar de restos e detritos.

Após uma série de confusões, Remy vai parar em Paris, mais precisamente na cozinha do restaurante Gusteau’s, que já fora em outros tempos o mais badalado da França, mas que no momento passa por um processo de decadência, após a morte de seu proprietário. O cenário está armado. De um lado, um restaurante sofisticado, que simbolicamente resiste à mania do fast food, das comidas congeladas e do mau gosto de uma forma geral. Do outro, um personagem extremamente talentoso, mas que jamais poderá esconder a genética de sua origem humilde: a de ser um rato.

Seria uma referência aos processos de intolerância contra os imigrantes que a França em particular e a Europa em geral vêm vivendo? O roteiro a direção de Brad Bird (também roteirista e diretor de Os Incríveis) abre um vasto campo de interpretações, sem deixar de lado o ritmo e o humor que um desenho animado deve ter. Ele faz uma ode ao talento, despreza a mesquinhez coletiva e constrói personagens dos mais "humanos" (mesmo que alguns deles sejam ratos), multifacetados, longe da simplificação fácil do bem contra o mal. Aqui, como na vida, os "heróis" também erram e os "vilões" também têm coração.

Exibição: dia 8, sábado, 19h, HBO

(celso sabadin)

* O multimídia - e querido amigo - Celso Sabadin é autor do livro autor do livro Vocês Ainda Não Ouviram Nada – A Barulhenta História do Cinema Mudo e jornalista especializado em crítica cinematográfica desde 1980. Atualmente, dirige o Planeta Tela (um espaço cultural que promove cursos, palestras e mostras de cinema) e é crítico de cinema da TV Gazeta e da rádio Bandeirantes.

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