quarta-feira, 29 de julho de 2009

Criança & TV: Desmistificar para educar

Em minhas andanças pela rede, encontrei esta interessante entrevista com Pedrinho Guareschi, autor do livro Sociologia Crítica, feita por Márcia Santos. O tema em pauta é a importância da TV na vida das pessoas, de seus filhos e da sociedade em geral. Além disso, discute como educadores (e acho que esse papel também cabe aos pais) devem agir para ajudar seus pimpolhos a desmistificarem a TV e a se tornarem mais críticos em relação ao que assistem. Bem, interessante. Aqui vai...

Intervalo: Em que contexto a televisão chegou ao Brasil?
Pedrinho Guareschi: Ela chegou ao Brasil em 1950 e seguiu mais ou menos o passo da nossa tradição que foi sempre ter alguém que é dono e os outros que são trabalhadores. Então, as capitanias hereditárias tinham alguns donos, depois veio a indústria com os capitães da indústria e, na década de 30, os donos de indústria passaram a ter rádio. Em 1950, os que tinham rádio passaram a ter televisão. E a TV que deveria ser um serviço público, que não tem dono, passou a ter. A TV chega em um contexto de propriedade, como continuação dos grandes latifundiários. Na atualidade, temos os latifundiários da mídia. Em cada estado e região, existe uma concentração da comunicação. Aqueles que concentram os meios de produção, das terras, das indústrias, vão ser também donos da mídia. Em 1974, os interesses estrangeiros na televisão brasileira começaram a se mostrar, principalmente na TV Globo. O dinheiro para implantar a emissora veio dos Estados Unidos, foram U$ 5 milhões, e aí esta TV despontou, enquanto as outras emissoras de TV brasileiras tinham um faturamento correspondente a cerca de R$ 300 mil. Como havia uma legislação dizendo que estrangeiros não podiam ser donos dos meios de comunicação no Brasil, a entrada de dinheiro americano não foi evidente. O nome do grupo Time Life não apareceu e, sim, o da família Marinho.

Por que a TV é considerada um meio de comunicação de massa?
Podemos dizer que o sentido mais leve disso é que a televisão está aberta a todos, é um canal aberto a todo mundo. Esse sentido é até positivo. Não se pode entender essa massa como uma população sem voz e sem vez, massificada. É preciso ter cuidado, porque não queremos transformar o povo em uma massa, mas, senão houver uma leitura crítica dos meios de comunicação, o povo será transformado em massa mesmo, afinal o formato da televisão tem esse objetivo.

Por que esse meio de comunicação exerce tanto fascínio sobre as pessoas?
Porque a televisão exibe três formas de comunicação ao mesmo tempo: som, texto e imagem, com todo o seu poder. Ela reúne essas três dimensões. E quanto mais sentidos são investidos em um meio de comunicação, ele se torna mais globalizado e totalizante.

Quais os prejuízos que a televisão pode trazer à educação?
A TV se tornou poderosa e estabelece uma relação vertical sobre as pessoas. Quando estamos conversando, você pode parar e me fazer uma pergunta. Na televisão, não, ela é a única que fala e fala sozinha. Fala com um poder fantástico de imagem, som, texto. Tudo isso exerce uma espécie de domínio, de fascínio. Mas há um aspecto mais sério, que é discutido no meu livro Mídia, Educação e Cidadania, da editora Vozes. A Inglaterra, a Suécia e a Dinamarca estão fazendo pesquisas sobre televisão e criança, relacionadas à escola, desde 1959. A conclusão a que chegaram na terceira fase, em 2002, é a de que, quanto menos televisão uma criança assiste, melhor. Isso porque, quando a criança lê histórias infantis, cria os personagens a seu modo. A cor, as formas, os movimentos, ela fantasia. Já a criança que assiste à TV, fica parada, inerte, recebe tudo ‘de mão beijada’, é só apertar o botão. Os pesquisadores concluírma que essa criança se torna apática, sem reação e esse é o grande mal da TV. Não quero generalizar, mas basta analisar o comportamento dos nossos jovens. Não existe iniciativa pra nada, vão na onda, no grito, no estímulo, não têm mais a consciência crítica para questionar. Então, o que a educação poderia fazer agora? Essa é a grande questão. A educação deve dar novamente a palavra aos educandos. Eles têm que falar, devem ser provocados. Tudo bem que se use os meios de comunicação para provocá-los, mas eles precisam refletir, não se pode permitir que a televisão faça tudo sozinha. Todas as mensagens não podem ser dadas exclusivamente pela televisão.

De que forma o professor pode usar a TV e outros meios de comunicação para educar, formar cidadãos bem-informados?
É necessário fazer uma leitura crítica da mídia. A sugestão é que o professor pegue os temas que a mídia apresenta e faça a crítica deles em sala de aula. E dou um exemplo: pegue um trecho de programas ou novelas, assista-os com os alunos, depois pergunte se gostou ou não, se concorda ou discorda, se discorda, de que outra forma faria. Assim, a turma fala, quando responde se gostou ou não; pensa, quando concorda ou discorda; e cria, quando se pergunta qual outra forma de fazer; e depois representa. Então, a partir dessa atividade se constrói outro trecho de programa ou capítulo de novela, com a turma estimulada. É possível ainda filmar e apresentar aos alunos sua própria produção. O interessante é que esse aluno, ao ver televisão em casa, nunca mais terá o mesmo comportamento. Depois de duas ou três vezes fazendo uma atividade como essa, ele vai ver os programas dizendo que faria de outra forma, que não concorda com determinada opinião ou atitude transmitida. Enfim, desmistifica o conteúdo. Esse é o trabalho que só a escola pode fazer, enquanto temos escola, porque daqui a pouco a mídia toma conta também da escola e dispensa o professor.

* entrevista com o professor e autor de vários livros sobre televisão e educação, pedrinho guareschi, feita por márcia santos, assessora de imprensa do sintese (sindicato dos profissionais da educação do sergipe) e publicada originalmente no site npc (núcleo piratininga de comunicação)

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