sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Literatura: Dragões de Éter

"E um lobo lhe devorou a avó". Com esta frase, o escritor brasiliero Raphael Draccon inicia sua narrativa em Dragões de Éter (Editora Leya Brasil). A promessa de com um muito fantasioso repleto de aventura, ação e seres fantásticos caiu por água abaixo nas primeiras 20 a 30 páginas. Confesso que nesse início de leitura me decepcionei um pouco e pensei várias vezes em largar o livro em algum canto da minha estante. Para mim, o enredo soava lento e tudo demorava demais para acontecer.

E ainda havia as idas e voltas na trama, para frente e para trás, o que estava me incomodando bastante. E ainda pesava o fato de que muitos haviam chamando Draccon de "inovador". Como assim? Afinal, a DreamWorks, anos-luz antes de Draccon, já havia estourado nos cinemas com sua animação Shrek. Mas, como não sou de desistir facilmente do que começo, segui em frente.

E eis que fui fisgada e tive que admitir que a trama de Draccon não tem tantas semelhanças com a do ogro verde - a não ser o fato de ambas darem versões modernas aos contos de fadas ao reunirem seus persongens para contar uma nova história. Logo estava devorando uma página atrás da outra, divertindo-me com essa nova releitura dos clássicos contos de fadas. E lá estavam Lobo Mau, Chapeuzinho Vermelho, João e Maria, Capitão James Gancho, Branca de Neve, o Príncipe Encantado... Todos vivendo em um único lugar.

Dessa vez, longe dos domínios de Shrek, mas em um lugar chamado Nova Ether. Lá "existem Reis com erres maiúsculos, príncipes e princesas em busca da perfeição, lobos famintos, piratas com suas próprias leis... E existe magia", conta Dracco em seu livro. E também as fadas. Elas tinham a missão de proteger e testar os humanos com provas que mostravam sua bondade, bravura e honestidade. Mas muitos humanos se mostraram fracos de caráter e até mesmo as fadas sucumbiram às tentações e surgiu a magia negra, nasceram então as bruxas. E com as bruxas as guerras, e com as guerras os caçadores de bruxas.

Aos poucos, o autor vai apresentando seu mundo e seus habitantes, mesclando figuras de mitologia com contos de fada e um toque de realidade. Conflitos, alianças, promessas, perseguições, amores e humor fazem parte da saga que narra a história de Arzallum, o maior reino de todos e do qual, atualmente, tem como Rei Primo Branford. Por 20 anos, ele e sua mulher Terra mantêm a paz e suas atitudes benévolas os fazem admirados por todos, sejam burgueses ou plebeus. Entretanto, coisas continuam a acontecer sem que o Rei perceba o perigo iminente: crianças são presas por bruxas, avós devoradas por lobos e piratas tocam o terror. Sem que se dê conta que o sombrio destino de sua família já estava traçado há tempos.

E, definitivamente, Dragões de Éter não é nenhum Shrek, mas tem seus méritos. A história é bem construída e apresentada de maneira cativante e convincente. Os personagens são verossímeis e muitas pessoas podem se identificar com eles, sendo completamente capazes de causar interesse, curiosidade, tristeza, alegria... O leitor também vai se surpreender ao reconhecer seus heróis de infância neste novo mundo, em que Branca de Neve tem conexões com Robin Hood – embora não da mesma forma que João e Maria se relacionam com Chapeuzinho Vermelho. Vai descobrir ainda que Gancho tem um filho, muito mais cruel que o pai.

Draccon traz esses personagens conhecidos do nosso imaginário mais próximo dos dias atuais, da realidade. E aí reside seu grande pecado. Ele parece que, às vezes, está muito preso ao nosso mundo e resiste um pouco em entrar a fundo em seu universo fantástico, em extropolar a fronteira do real e do imaginário. Senti também falta de grandes batalhas e aventuras - talvez aconteçam nos próximos volumes da trilogia, Corações de Neve e Círculos de Chuva.

No geral, o livro me agradou bastante e recomendo a todos os fãs de literatura fantástica. Tem leitura fluida, fácil de acompanhar e até me causou certa dependência - não consegui parar de ler até chegar à ultima página. E aqui vai uma advertência: Dragões de Éter - Caçadores de Bruxa causa insônia, dor nas costas (dependendo do sofá ou da posição em que você permaneceu durante a leitura) e vista embaçada ao amanhecer.

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